quarta-feira, 9 de novembro de 2011

Hístoria-Sob a mira de um revólver - Purim 1920



Sob a mira de um revólver


Purim 1920

Rabino Shneur Zalman Havlin, um proeminente chassid de Israel, visitou o Rebe Rashab antes da Primeira Guerra. Por causa do conflito, não pôde retornar a Israel senão muito tempo depois. Nesta carta a seu tio Reb David Shifrin, ele descreve o último Purim do Rebe.

Logo após Sucot de 1920, o Rebe e sua família mudaram-se para Rostov. Ele enviou sua biblioteca a Moscou, mas levou seus manuscritos consigo para Rostov. Muitos chassidim procuravam o Rebe em Rostov. Ele ensinava Chassidut, reunia-se com as pessoas e dava-lhes conselhos. A cada Yom Tov, o Rebe promovia um farbrenguen, fortalecendo e encorajando os chassidim. No inverno, os bolcheviques avançaram em direção a Rostov. Antes que a família do Rebe pudesse escapar, os bolcheviques entraram na cidade, e deixá-la tornou-se impossível.

O relacionamento do Rebe com os chassidim se alterou. Ele distanciava-se e meditava sozinho em seu aposento. Os chassidim não o visitavam para rezar, para farbrenguen ou para ter uma yechidut particular com o Rebe. Este estado de coisas continuou durante Shevat e metade de Adar.

Em Purim, fomos visitar o Rebe, mas recebemos a comunicação de que faria apenas uma breve palestra e então todos iriam para casa. Os bolcheviques eram muito rigorosos. Havia toque de recolher e ninguém tinha permissão de ficar na rua após as 19 horas. Mesmo durante o dia não se podia sair, a menos que fosse muito urgente. Todas as reuniões públicas estavam proibidas.

O Rebe disse lechayim, e sentimos uma grande mudança em seu estado de espírito. Ele nos encorajou a ser felizes. Deu dinheiro para que alguém fosse comprar bebidas alcoólicas, e pediu-nos para cantar como nos bons dias de outrora. Ficamos chocados. Havíamos planejado deixar a casa do Rebe logo após sua palestra, mas agora cantávamos com tanta devoção que o barulho podia ser ouvido na rua. Simplesmente esquecemos dos bolche¬vi¬ques. O Rebe nos disse para beber e cantar, e nossos espíritos subiram às alturas. A família do Rebe estava muito temerosa. A Rebetsin implorou para cantarmos baixinho, para que não nos ouvissem lá fora. Mas não podíamos contrariar a ordem do Rebe para comemorar com júbilo.

O filho do Rebe, o Rayats, temia pela segurança do pai. Mas o Rebe nos fortaleceu com palavras bondosas, repletas de sabedoria e ânimo. Disse a seu filho: “Yossef Yitschac, não tenha medo! Eles não me impressionam! Venceremos no final! Não quero dizer apenas nos escondendo nos porões, mas saindo às claras, com nossa essência! Continuaremos a existir, seja de modo gradual ou de repente, como ‘alguém que salta sobre os muros’. É assim que me sinto. Ficaremos em segurança, porque a perversa kelipá (força negativa), comparada à santidade, não tem valor algum. Desejo que a santidade seja revelada…”

Sua face estava em fogo e suas palavras eram chamas flamejantes. Jamais víramos o Rebe assim antes. Aquela noite inteira foi extraordinária, com o Rebe falando dos profundos segredos de Torá. De repente, ouvimos as más novas. Os bolcheviques estavam dando uma batida em todas as casas para ver se as pessoas estavam obedecendo o toque de recolher. Logo chegariam à casa do Rebe. Estremecemos. Éramos uma multidão e qualquer assembléia era ilegal. As autoridades puniam severamente aqueles que desobedeciam.

Mas o Rebe não parou seu farbrenguen e suas palavras de Torá nem por um instante. Todos sabiam as conseqüências. As pessoas falaram com o Rebe sobre os bolcheviques, mas ele não se importou. Pelo contrário, encorajou-nos a cantar com mais vigor ainda.

Houve uma batida à porta, e o Rebe disse-nos para abrir. Voltou-se para os chassidim como se nada tivesse acontecido. Os policiais olharam para nós. Um chassid disse-lhes que o Rebe estava muito ocupado e não tinha tempo para falar com eles. Perguntaram quando estaria disponível, e ele respondeu: “Muito mais tarde. Esta reunião terminará em duas horas.” Não esboçaram nenhuma reação e se retiraram.

Começamos a cantar novamente. O Rebe disse mais palavras de Torá, e quando terminou, explodimos em melodias (nigunim) animadas e repletas de devoção. Várias horas depois, bateram à porta. Não prestamos atenção por estarmos tão envolvidos no canto. As batidas ficaram mais fortes. Sabíamos que a polícia voltara para examinar a casa.

As mesas estavam postas com vinho e bebidas mais fortes, o que era proibido por lei. Havia também uma quantia substan¬cial de dinheiro de tsedacá em uma bandeja. Isso era rigorosamente proibido por lei. Não tínhamos a menor idéia de como lidar com aquela situação perigosa.

O Rebe sentiu nosso apuro e disse-nos para não tirarmos nada da mesa. Disse então: “Abram a porta. Não tenho medo deles!” A porta se abriu e a polícia entrou com armas carregadas. Aproximaram-se da mesa e ficaram bem em frente ao Rebe. Mas o Rebe não lhes deu atenção. Virou-se para nós e disse: “Falaremos Chassidut e eles desaparecerão por si mesmos.” E começou a pronunciar a explicação chassídica sobre o versículo da Torá: “Amalec foi a primeira das nações e no futuro perecerá.” O Rebe disse o Maamar por uma hora e meia.

Durante todo o tempo em que ele falou, os bolcheviques simplesmente ficaram em frente ao Rebe, olhando-o. Quando terminou, os bolcheviques saíram sem pronunciar uma palavra.

Foi um milagre que ninguém se ferisse. Não posso acreditar que tenha acontecido. Mesmo enquanto estávamos tremendo de medo, tínhamos fé em D’us e em seu servo, o Rebe. Estávamos conectados ao Rebe e não pensamos em nada mais. Não queríamos perder uma única palavra. Jamais esquecerei aquilo que vimos e ouvimos naquela refeição de Purim.

Aquele jantar de Purim durou doze horas. Na verdade, aquele farbrenguen foi como uma reunião de despedida, porque duas semanas depois, o Rebe faleceu, em 2 de Nissan.

Fonte:http://www.chabad.org.br/