quarta-feira, 23 de novembro de 2011

História Chassidica: A chama que desaparecia - Por: Yrachmiel Tilles




A chama que desaparecia
Por: Yrachmiel Tilles

Era a primeira noite de Chanucá. Lá fora a nevasca rugia, mas dentro da casa estava tranqüilo e aquecido. O Rebe, Rabi Baruch de Mezibush, neto do Báal Shem Tov, estava em frente da menorá, rodeado por um grupo de seus chassidim. Ele recitou as bênçãos com grande devoção, acendeu a única vela, colocou o shamash (vela auxiliar) em seu lugar designado, e começou a cantar HaNerot Halalu. Seu rosto irradiava santidade e alegria; os chassidim, em reverência, olhavam-no atentamente.

A chama da vela estava queimando fortemente. O Rebe e os chassidim sentaram-se para cantar Maoz Tsur e outras canções de Chanucá. De repente, a vela começou a tremular e saltar como louca, embora não houvesse a menor brisa dentro da casa. Era como se estivesse dançando. Ou lutando. E então, desapareceu!

Não se apagou, não havia fumaça, simplesmente não estava mais ali. Era como se tivesse voado para algum outro lugar. O próprio Rebe parecia perdido em pensamentos. Seu criado aproximou-se para reacender o pavio, mas o Rebe o dispensou com um gesto.

Ele fez sinal aos chassidim para continuarem cantando. Diversas vezes, entre as estrofes, o Rebe falou palavras de Torá. A noite passou agradavelmente, e todos os chassidim se esqueceram da chama de Chanucá desaparecida.

Era quase meia-noite quando um ruído de rodas de carruagem passando pela neve e gelo dissiparam a tranqüilidade. A porta abriu-se de repente e entrou um chassid que vinha de uma aldeia distante. Suas roupas estavam rasgadas e imundas, o rosto inchado e sangrando. E mesmo assim, num chocante contraste com o seu estado físico, seus olhos brilhavam e suas feições reluziam com alegria.

Ele sentou-se à mesa, e com todos os olhos sobre ele, começou a falar empolgadamente. "Esta não é a primeira vez que venho a Mezibush pela rota da floresta, e conheço muito bem o caminho. Porém esta semana havia uma terrível tempestade, que atrasou bastante o meu avanço. Comecei a preocupar-me em não chegar aqui a tempo para estar com o Rebe na primeira noite de Chanucá. A idéia perturbou-me tanto, que decidi não esperar o fim da tempestade, mas seguir em frente e viajar dia e noite, na esperança de chegar ao meu destino a tempo.

"Foi uma tolice, devo admitir, mas só percebi isso muito tarde. A noite passada, fui perseguido por uma gangue de bandidos, que ficaram felizes ao me encontrar. Eles pensaram que como eu estava fora naquela terrível tempestade e ainda por cima sozinho, à noite, deveria ser um rico mercador cujos negócios não podiam esperar. Eles exigiram que eu lhes entregasse todo o dinheiro que tinha comigo.

"Tentei explicar, implorei, mas eles se recusaram a acreditar que eu não tinha dinheiro. Agarraram as rédeas dos meus cavalos e subiram na carroça. Sentou-se um de cada lado comigo no meio, para vigiar-me, e então me levaram na carroça para encontrar o chefe deles que decidiria meu destino.

"Enquanto eles esperavam que o chefe chegasse, fizeram-me muitas perguntas, revistaram a carroça e tudo que havia, tentando descobrir onde eu escondera o dinheiro. Eu podia apenas dizer a verdade, e aquilo eles não estavam preparados para aceitar.

"Após horas de tortura, eles me amarraram e me jogaram, cansado e ferido, num porão escuro. Eu estava sangrando das feridas que tinham me infligido, e meu corpo inteiro doía. Fiquei ali até a noite, quando o líder do bando chegou para falar comigo.

"Tentei descrever para ele, da melhor maneira possível, a alegria de estar na presença do Rebe, e como era tão importante que eu estivesse com ele no início do feriado, a ponto de me arriscar viajando à noite.

"Creio que minhas palavras o impressionaram, ou talvez ele fosse persuadido pela minha firmeza mesmo sob tortura. Mas seja o que for, graças a D’us ele me libertou das algemas, dizendo:
"Sinto que a sua fé em D’us é forte e sua vontade de estar com o Rebe é intensa e genuína. Agora veremos se esta é a verdade. Vou deixá-lo ir, mas saiba que o caminho é muito perigoso. Até as pessoas mais calejadas não se aventuram sozinhas pela floresta, somente em grupos, ainda mais à noite e sob uma tempestade. Você pode partir e tentar sua sorte. E se conseguir passar pela floresta e pelas outras condições em segurança, sem ser ferido pelos animais selvagens ou qualquer outra coisa, então desmancharei o meu bando e passarei a agir corretamente.

"Se você chegar mesmo aos arredores da cidade, jogue seu lenço na vala perto da estrada, atrás do poste. Um de meus homens estará ali esperando, e assim saberei que você conseguiu.
"Mais uma vez, fiquei apavorado. As provações pelas quais eu passara estavam entranhadas em minha alma, e agora pesadelos ainda piores me aguardavam. Mas quando pensei como é maravilhoso estar com o Rebe na hora de acender a chanukyiá, afastei minhas apreensões e resolvi não esperar nem mais um minuto. Devolveram meu cavalo e a carroça e segui o meu caminho.

"Havia uma escuridão total à minha volta. Eu podia ouvir os rugidos dos animais na floresta, e pareciam estar perto. Temia que pudesse estar cercado por uma matilha de lobos ferozes. Esporei o cavalo. Ele se recusou a avançar naquela escuridão. Chicotiei-o. Ele não se mexeu. Eu não sabia o que fazer. Naquele momento, uma pequena luz tremulou na frente da carroça. O cavalo moveu-se na direção dela. A luz avançou. O cavalo a seguiu. Durante todo o caminho, os animais selvagens fugiram de nós, como se a pequena chama os estivesse afugentando.

"E assim seguimos a chama até lá. Cumpri minha parte do acordo e joguei o lenço no local designado. Quem sabe? Talvez aqueles bandidos cruéis mudassem seu procedimento, pelo mérito daquela pequena luz."

Foi somente então que os chassidim perceberam que a luz de Chanucá do Rebe tinha voltado. Ali estava ela, ardendo na elaborada menorá, sua chama forte e pura como se tivesse acabado de ser acesa.

Nota biográfica:

Rabi Baruch nasceu em 1753 em Mezibush, a cidade na qual seu ilustre avô, Rabi Israel Báal Shem Tov, liderou o Movimento Chassídico por ele fundado. Rabi Baruch era filho da filha do Báal Shem Tov, Adel, e seu marido, Rabi Yechiel Ashkenazi. Ele foi um dos mais importantes Rebes da geração dos discípulos do Maguid de Mezeritch e tinha milhares de chassidim.



Fonte:http://www.chabad.org.br/